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    Especialistas não veem ataque aos consumidores em nova lei do distrato – (FOLHA)

    Especialistas não veem ataque aos consumidores em nova lei do distrato

    Advogado diz que ainda há brecha jurídica sobre multa para quem desiste da compra

    O presidente Michel Temer sancionou nesta quinta-feira (27) sem vetos a proposta que eleva a multa para quem desiste da compra do imóvel na planta.

    A medida será publicada na edição desta sexta-feira (28) do Diário Oficial da União e passa a vigorar imediatamente para os novos contratos.

    Não há legislação anterior específica sobre o tema, mas a jurisprudência estabelecia multas de 10% a 25% do valor pago pelo consumidor no imóvel.

    De acordo com o texto aprovado pelo Congresso Nacional, porém, a incorporadora poderá reter até metade desse montante caso o comprador decida romper o contrato em um empreendimento construído no regime de patrimônio de afetação.

    Por esse regime, o mais comum no país, o patrimônio do empreendimento é separado daquele da empresa; o intuito é assegurar a entrega das unidades mesmo em caso de falência da construtora.

    Pela nova lei, a devolução da outra metade ao consumidor deverá ocorrer em até 30 dias após a expedição do habite-se (licença de ocupação).

    Já em empreendimentos construídos fora do regime, o teto da multa cai para 25%, além da comissão de corretagem. O pagamento ao comprador deverá ser por parcela única e em até 180 dias da data do desfazimento do contrato.

    A regulamentação do chamado distrato é a principal reivindicação das incorporadoras. Elas alegavam que a ausência de uma legislação específica gerava insegurança jurídica.

    “A construção representa uma massa salarial muito grande. O segmento tendo segurança, deverá voltar a empregar e trilhar um caminho de crescimento”, afirma Luiz Antonio França, presidente da Abrainc (associação do setor).

    A nova lei reconhece ainda que as incorporadoras têm um prazo de 180 dias de atraso para entregar o móvel, a partir da data estipulada em contrato, sem incidência de multa.

    Passada essa “carência”, o comprador tem direito à restituição integral do valor pago, além da multa pactuada em contrato. Se quiser aguardar a entrega da unidade, será devido ao consumidor adimplente indenização de 1% do valor pago à incorporadora para cada mês de atraso.

    No início deste mês, a Câmara dos Deputados manteve as emendas feitas pelo Senado em novembro, com alterações de redação e novo detalhes para dar segurança jurídica. A principal mudança em relação ao texto votado em junho na Câmara estabelece que os contratos precisam ter um quadro-resumo com as condições das negociações.

    Ele deve conter informações como preço, taxa de corretagem, forma de pagamento, índice de correção monetária, taxas de juros e as consequências da quebra de contrato.

    “É um benefício ao consumidor. A ideia é deixar muito claro o que está sendo tratado. Tudo tem de estar no quadro, é condição de validade do contrato”, diz Lucas Paim, do escritório CSMV Advogados.

    Daniel Cardoso Gomes, sócio do Mannrich e Vasconcelos, destaca ainda que a lei prevê expressamente um direito de arrependimento de até sete dias para contratos firmados em estandes de vendas e fora da sede do incorporador, com a devolução de todos os valores antecipados.

    “O saldo é positivo. Não vejo nenhuma infração ao CDC [Código de Defesa do Consumidor] A lei é importante para tornar objetiva uma questão que estava extremamente subjetiva”, diz Marcelo Manhães de Almeida, presidente da comissão de direito urbanístico da OAB-SP.

    Para Armando Luiz Rovai, professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e ex-secretário nacional do consumidor, porém, a lei “deixou de lado preceitos da defesa do consumidor”.

    “É importante olhar para a parte produtiva, mas não podemos esquecer a defesa do consumidor, que é garantida pela Constituição. Houve um desequilíbrio para um dos lados e quem vai ficar mais vulnerável é o cidadão”, afirma.

    Guilherme Penteado, do Porto Lauand Advogados, observa que o tema ainda pode gerar ruído no judiciário.

    “Há brecha para se levantar, por exemplo, o artigo 413 do Código Civil, que diz que a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo”, diz.

    25%
    é o valor da multa por distrato de imóvel que não for constituído no patrimônio de afetação

    50%
    é o percentual da multa por distrato de imóvel na planta constituído em patrimônio de afetação

    > O cliente perderá integralmente os valores pagos com comissão de corretagem

    > Não incidirá a cláusula penal se o comprador encontrar um substituto que assuma seus direitos e obrigações originais, desde que haja a devida anuência da incorporadora

    180 dias
    é o prazo para a restituição dos valores ou, se houver patrimônio de afetação, após 30 dias da obtenção do Habite-se da incorporação

    > O valor da multa cabível deve se limitar aos valores já pagos pelo comprador (que ainda não usufrui do imóvel)

    7 dias
    é o prazo para arrependimento da compra, a partir da assinatura do contrato, se o contrato for firmado em estande de venda e fora da sede da incorporadora

    > Atraso de até 180 dias para a entrega do imóvel vendido na planta não gerará ônus à construtora
    > Se o atraso for superior, o comprador poderá desfazer o negócio e terá direito a receber todo o valor pago, além da multa prevista em contrato, em até 60 dias
    > O cliente pode optar ainda por manter o contrato, com direito a multa de 1% por mês de atraso

    Fonte: CSMV Advogados

    Anaïs Fernandes , Angela Boldrini e Gustavo Uribe

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